Pois é... também duvidei quando minha mulher me avisou sobre o que havia saído na imprensa em Novembro de 2008, quando eu estava no II Congresso Gaúcho de Infectologia em Gramado (e ninguém havia comentado nada sobre o assunto no congresso).
Inicialmente, quem é o paciente de Berlim?
Este relato de cura da infecção pelo HIV foi apresentado na 15° Conferência de Retrovírus e Infecções Oportunistas (CROI) em 2008 em Boston nos Estados Unidos. O poster 719 foi apresentado na conferência pelo grupo do Hospital Charité (Campus Benjamim Franklin) de Berlim, um dos hospitais mais tradicionais em pesquisa da Alemanha – foto. O poster relatava o caso de um paciente de 40 anos, com infecção pelo HIV e Leucemia que, após realizar um transplante de medula óssea no ano de 2007, suspendeu o uso da terapia anti-retroviral (coquetel anti-HIV) e 285 dias após a suspensão não apresentava partículas virais detectáveis no sangue. O paciente havia recebido a medula de um doador que apresentava a mutação genética CCR5-delta32. Nossas células de defesa podem apresentar os receptores CCR5 e CXCR4, que são as portas de entrada para o vírus. O vírus R5 escolhe entrar pela porta CCR5 e os vírus X4 escolhem a entrada CXCR4. Este paciente apresentava o vírus R5 e recebeu no transplante o gene mutante que confere um bloqueio da porta de entrada CCR5, o que funcionalmente conferiu “cura” da infecção. O termo “cura funcional” é aplicado porque o vírus não é eliminado totalmente do corpo e permanece viável nos gânglios linfáticos, por exemplo, embora não seja detectado no sangue.
Nova publicação (
bloodjournal, 2010) atualizando este caso, relata que o paciente ainda encontra-se “curado” da infecção e com completa reconstituição do sistema imunológico. Ainda, 3,5 anos após o transplante os reservatórios para o vírus diminuíram consideravelmente, o que é uma excelente notícia, tendo em vista que os reservatórios virais são um dos grandes obstáculos para a cura da infecção com a terapia anti-HIV somente. Então este relato traz uma nova perspectiva em termos de cura e manejo da infecção e esperança para os pacientes, embora muitos pontos ainda permaneçam obscuros e mereçam investigação. O transplante de medula óssea é um procedimento muito agressivo, portanto não será a forma escolhida para tratamento da infecção, mas estudos na direção da inibição destes receptores (CCR5 ou CXCR4) deverão ser objeto de investigação futura.